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Os Verdadeiros Subsídios do Setor Elétrico

Abrimos a Caixa Preta da Conta de Desenvolvimento Energético

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Por Daniel Lima – Economista e Liderança do Movimento Solar Livre

Disponível na Internet

Abrimos a Caixa Preta da Conta de Desenvolvimento Energético

O consumidor brasileiro iniciou o ano com mais um peso no bolso. Pois é, terão que arcar com R$ 20,1 bilhões, que representam 92% de toda a despesa da Conta de Desenvolvimento Energético – CDE, que continua subsidiando o setor energético em 2020. A cobrança desta conta será realizada através de aumentos nas tarifas de energia dos consumidores livres e cativos integrantes do Sistema Interligado Nacional – SIN.

Inicialmente vamos entender um pouco como funciona a CDE. A partir de meados de 2017, a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica – CCEE é que realiza a gestão financeira e operacional da CDE. Para cobrir esses serviços, foram previstos R$ 25 milhões no orçamento deste ano, que só para constar, só essa despesa cresceu 125% em relação ao orçamento da 2019.

A CDE é uma conta cuja arrecadação é utilizada, entre outras finalidades, para promover a competitividade de geração, através de subsídios nas tarifas de uso das redes de distribuição e transmissão de diversas fontes de energia, além abrigar a Conta de Consumo de Combustível – CCC, que subsidia o consumo de combustíveis fósseis para a geração termelétrica em sistemas isolados do país, e de quebra, a conta Reserva Global de Reversão – RGR, que subsidia projetos de melhoria e expansão para empresas do setor energético.

 Os subsídios, conceitualmente, são transferências governamentais para o setor privado, e visam reduzir o preço ao consumidor de algum produto ou o custo do produtor para produzir algo. Mas no caso da CDE, acontece justamente o contrário, quem está subsidiando, ou transferindo dinheiro, para o setor elétrico, que é um serviço público, é a iniciativa privada através dos milhões de consumidores de energia brasileiros.

Em contrapartida a esse repasse de recursos do setor privado para o setor público, ao invés de diminuição de custos para o setor privado, provoca-se impacto positivo no preço das tarifas de energia. Formando assim, um ciclo perverso onde cada vez mais a iniciativa privada subsidia atividades de competência pública, recebendo de volta aumento nos custos dos serviços públicos de energia.

Mas vamos aos números. Foi previsto no orçamento de 2020 da CDE, subsídios no valor total de R$ 21,9 bilhões, que devem contribuir com um aumento médio de 2,38% nas tarifas de energia em 2020 (configuração do ciclo perverso). Esse aumento não é pequeno, pois a previsão da inflação para 2020, calculada pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA, é de 3,60%.

Para se ter uma ideia do que representa R$ 21,9 bilhões, vale a pena alguns comparativos: O orçamento do Bolsa Família para 2019 foi de R$ 30 bilhões; o orçamento do Minha Casa Minha Vida para 2019 foi de R$ 4,6 bilhões, em 2020 vai ser de R$ 2,7 bilhões. Então como pode ser visto estamos lidando com muito dinheiro na forma de subsidios.

A CCC, que integra a CDE, tem por finalidade subsidiar os Sistemas Isolados, que são compostos por localidades que por alguma razão técnica ou econômica, não estão conectadas ao SIN e, dessa forma, são atendidas por sistemas regionais isolados. Os estados que compõem tal sistema são: Acre, Amazonas, Amapá, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Pernambuco, em virtude da ilha de Fernando de Noronha. Pelo fato de não estarem conectados ao resto do sistema, tais localidades são dependentes, essencialmente, da geração térmica local (Termelétricas) e, pela dificuldade de acesso a algumas regiões, o preço do combustível para suprir tal carga é bastante elevado.

A carga própria dos Sistemas Isolados para 2020, foi estimada em 483 MWmed, equivalentes a 0,7% da carga total do Brasil. A previsão de geração somente através de usinas termelétricas movidas a óleo diesel, atingiu montantes a serem reembolsados de 1.831.524 MWh, com previsão de consumo de aproximadamente 505 milhões de litros, ou seja, mais de 1,3 milhões de litros de óleo diesel por dia.

Apesar de todo este volume de óleo diesel a ser consumido diariamente pelas termelétricas, os preços estabelecidos como referência para reembolso (subsídio) do mesmo, serão definidos pela média do preço de compra nos postos de combustível no mercado local. É um excelente negócio para quem vende óleo, não é mesmo.

Mas os subsídios não acabam por aí, a CDE também subsidia o carvão mineral brasileiro. A justificativa para tal subsídio é compensar o baixo poder calorífico do carvão mineral nacional com relação ao do carvão importado. Sendo assim, o governo para estimular a utilização do carvão nacional na produção de energia elétrica, cujas maiores jazidas e 100% das usinas encontram-se na região Sul do país, definiu 100% de reembolso para as usinas que utilizem a matéria-prima nacional.

As quotas a serem pagas pelos consumidores de energia (Quotas CDE – Uso), no montante de R$ 20,1 bilhões, cresceram 24% nas Receitas do orçamento da CDE de 2019 para o de 2020, representando 92% da Receita. Vale repetir que esse valor deve ser pago por todos os consumidores cativos e livres, sendo repassado na fatura de energia elétrica (“conta de luz”) como encargo setorial.

O valor da CCC para 2020, no montante de R$ 7,5 bilhões, resultou num aumento de 19% em relação ao orçamento de 2019, em função do atendimento de todo o estado de Roraima (antes atendido pela energia importada da Venezuela) por 5 usinas termelétricas (UTEs Tambaqui, Jaraqui, Cristiano Rocha, Manauara e Ponta Negra) com capacidade instalada total de 216,5 megawatts (MW).

Fico pensando, porque não se instalar grandes usinas eólicas e solares nessas localidades, diminuindo assim a dependência das termelétricas. Com o dinheiro da CCC para 2020, daria por exemplo, para construir 1,5 GWp de UFVs (Usinas Fotovoltaicas). Com esses investimentos a economia dessas localidades seriam beneficiadas também com aumento de renda e empregos.

Um número nos chama bastante atenção. Estão previstos R$ 2,6 bilhões para atendimento a Tarifa Social (Baixa Renda), que atende cerca de 9 milhões de famílias com desconto médio um pouco maior do que R$ 20 por família. Com este dinheiro daria para, ao invés de dar descontos a cada ano, investir na implantação de 9 milhões de micros UFVs de 700 Wp, ao custo unitário de R$ 3.500,00 por família, com capacidade média de geração de 80 kWh/m e que traria economia de cerca de R$ 35,00 em energia para as famílias.

Ou seja, resolveria o problema de uma vez só, injetando dinheiro na economia e dinamizando a cadeia produtiva do setor elétrico, com as aquisições e toda a mobilização de trabalhadores (empregos) para instalação dessas UFVs, diminuindo assim o peso no bolso do consumidor brasileiro.

Como pode ser observado no Gráfico 1, que representa a soma dos subsídios da União (subsídios públicos), e dos subsídios arrecadados através das tarifas de energia (subsídios privados), os subsídios da CDE cresceram 251,5%, em termos reais, desde 2007. Mas, analisando a composição dos mesmos, observa-se que a União diminuiu drasticamente sua participação nos subsídios, a partir do ano 2015, passando os mesmos em sua quase totalidade a serem arcados pelos consumidores de energia elétrica.

É possível observar, que as quotas pagas pelos consumidores de energia (Quotas CDE – Uso), totalizaram no período de 2013 a 2018 cerca de R$ 60 bilhões e foram a principal fonte de recursos na maior parte do período. Somados a cerca de R$ 18 bilhões em 2019 e R$ 20 bilhões em 2020, estamos chegando perto, em 8 anos, de R$ 100 bilhões transferidos (pagos) do consumidor brasileiro para subsidiar o setor elétrico.

Verifica-se também, que a CCC e os Descontos Tarifários na Distribuição são as principais despesas da CDE. E que no período de 2013 a 2018, foram destinados mais de R$ 6 bilhões para subsidiar a utilização do carvão mineral nacional, utilizados para geração de energia em usinas localizadas na região Sul do país. Com isso, chega-se a outra interessante conclusão, o Brasil continua a transferir renda de muitos, para poucos, e para estados ricos.

Como pode ser observado abaixo, os sistemas isolados foram os maiores beneficiários, em 2018, dos recursos da CDE, seguidos pelos geradores e consumidores de fontes incentivadas.

Fonte: Ministério da Economia

Vale uma informação neste momento, a Micro e Minigeração de Energia Distribuída – MMGD, como pode ser observado acima, não recebeu um único tostão dos subsídios da CDE. Esta informação é muito importante neste momento em que a ANEEL abriu Consulta Pública para mudar as regras do segmento, utilizando como justificativa a existência de subsídios cruzados, beneficiando consumidores usuários da MMGD, em detrimento dos demais usuários do SIN. Este assunto merece ser melhor estudado. Um bom caminho seria quantificar os ganhos com a MMGD (redução de perdas técnicas e não técnicas do setor elétrico, ganhos ambientais, diminuição do risco hidrológico, aumento de emprego, renda e arrecadação de tributos, entre outros) e as perdas (uso da rede de distribuição).

Em estudo recentemente realizado pelo Ministério da Economia, foi identificado grande oscilação no orçamento anual da CDE, que girava em torno de R$ 5 bilhões (preços de 2018) de 2007 a 2012, e cresceu de forma expressiva (280%) no período de 2013 a 2018, quando passou a oscilar em torno dos R$ 20 bilhões anuais.

No momento atual, o setor elétrico enfrenta desafios excepcionais com a utilização de fontes de geração de energia com custos altíssimos, tendo como base o consumo de combustíveis fósseis, situação agravada pelos efeitos das condições climáticas que elevam em nosso país o risco hidrológico. Tudo isso reflete decisões governamentais, portanto, não se pode isentar o governo de sua responsabilidade na definição de políticas públicas que venham de encontro a um novo modelo energético, que pode estar em sintonia com os demais países do Mundo, onde se faz claramente opção pela geração de energia por fontes limpas.

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